Durante o ano escutista 2009 / 2010 o nosso agrupamento está a comemorar os 30 anos do primeiro acampamento de agrupamento, de 17 a 24 de Agosto de 1980.
Por isso, foi proposto a todas as secções que em Março de 2010 apresentassem um imaginário e uma mística para a nossa actividade.
“O imaginário é o que nos conduz a empreender o jogo. Um simples tema de actividade, sem um sonho subjacente, que não sacuda a nossa imaginação, não nos entusiasma. Faltará dinamismo ao grupo. O interesse será fraco e cairá rapidamente. Em todas as idades se encontra o imaginário. Os adolescentes que decidem descer um rio em canoa, são impulsionados pela sua imaginação, pela exploração possível. Para eles trata-se de um apelo para crescer, para descobrir as suas possibilidades. Eis porque esta acção lhes agrada. É preciso fazer nascer o sonho, estimular a imaginação, em vez de obrigar a escolher entre algumas actividades possíveis.
O jovem não pode desenvolver-se sem modelo. Identificando-se com uma personagem, o jovem atribui-se implicitamente um objectivo. Ele vai querer adquirir as competências, as qualidades, as energias do seu «modelo». Quererá «ser alguém».
Qualquer projecto, para preencher verdadeiramente o papel que lhe é exigido, deve responder às aspirações do jovem, ser verdadeiramente uma aventura, um apelo, uma esperança. Todo o projecto parte portanto necessariamente dos desejos mais ou menos expressos, de sonhos. Na prática estes sonhos materializam-se mais frequentemente na construção dum imaginário e de símbolos. Traduzem-se mesmo por diversos personagens: Vasco da Gama, Marco Polo, Touro Sentado, etc., porque é o herói que leva o jovem à acção; mas também passam por locais, situações, fenómenos sociais: o acampamento torna-se o forte, os cavaleiros partem à descoberta do tesouro perdido; o
Conselho reunir-se-á à volta do velho carvalho dentro de instantes.
Este imaginário existe em todas as idades: apenas se torna menos explícito com o crescimento, e vai-se transformando cada vez mais em situações reais, em que os personagens adquirem um papel social, uma existência real. Assim, ao longo do seu desenvolvimento, o imaginário permite aos jovens uma aprendizagem social cada vez mais próxima da vida real. É a imaginação que transfigura a acção em projecto, em aventura; quer passe por identificações explícitas, quer por um simples apelo para ser mais, para viver mais, para realizar uma proeza.
«Para que os vossos rapazes dêem tudo o que podem, é necessário que vejais as coisas com os olhos deles: o bosque será a floresta com os bandidos escondidos nas moitas, a margem onde se passa será a costa de África com os piratas moiros... O prado no meio da aldeia, onde pastam as ovelhas, poderá ser a grande pradaria cheia de bisontes e de Peles-Vermelhas e a vossa imaginação transformará as ruelas estreitas em gargantas de montanha que abrigam salteadores e ursos. Uma vez comprometidos nesta via, vereis até que ponto é mortalmente aborrecido o exercício rotineiro que o chefe desprovido de imaginação obriga a fazer, e a quantidade de coisas de que se esquece de tirar partido...»
Baden-Powell sabe que não é com “sermões” sobre ideal de vida que consegue fazer com que ele seja aceite. Por isso, cria um jogo, juntando os rapazes e organizando-os em grupos, com papéis, regras e espaços definidos. Para esse Jogo, que testa em Brownsea, escreve histórias, evoca ambientes, apresenta pessoas/heróis, propõe símbolos; numa palavra: cria um Imaginário. E do diálogo entre este imaginário e a sua intenção educativa, que é transmitir aos jovens o ideal de vida sintetizado no Espírito Escutista, nasce a Mística, que dá forma, alma e conteúdo ao Jogo Escutista.
O Escutismo é um Jogo libertador. Por isso, Baden-Powell não impõe uma Mística. Propõe um Imaginário, para que a Mística resulte de um processo personalizado de interiorização, de auto-contrução, de adesão progressiva e pessoal aos valores transmitidos pelo conjunto dos símbolos, heróis, tradições... que constituem esse Imaginário, em pleno Jogo, regulado pelas regras que o orientam – a Lei, à qual cada um se vincula pessoalmente pela Promessa. Lei e Promessa que são a mais fundamental das fontes do Espírito Escutista e, simultaneamente, a sua maior expressão.
Se percorrermos o Escutismo para Rapazes à procura das fórmulas que definam a Mística Escutista, ficaremos desiludidos. De facto o que lá encontramos é um riquíssimo Imaginário, capaz de ir ao encontro das situações e expectativas dos jovens daquele tempo, bem como as coordenadas essenciais do Jogo para viver esse Imaginário.
Um Imaginário feito de histórias de exploradores, fronteiros, pioneiros, caçadores e missionários; feito das histórias do Kim e dos Cadetes de Mafeking; feito do ideal da cavalaria, da opção pela natureza e dos horizontes largos e puros da vida ao ar livre; feito de Símbolos, Tradições, Ritos, Fórmulas, tudo para juntar e orientar as pessoas e expressar o que têm em comum... enfim, um Imaginário sedutor, que torna presente no Jogo Escutista a Mística, que resulta já, do diálogo entre o próprio Imaginário e o Espírito Escutista que Baden-Powell desejava propor com ideal de vida aos rapazes do seu tempo.
A Mística, pelo Imaginário, concretiza o Espírito, dá-lhe um corpo, que o Jogo põe em relação: dá-lhe um rosto, dá-lhe palavras para se dizer, símbolos para se significar, tradições para se cumprir, heróis para se mostrar como caminho a percorrer... tudo em pleno Jogo. A Mística é, ao mesmo tempo, o sentido proposto no Jogo e pelo Jogo e a adesão a esse sentido, por parte dos intervenientes no Jogo: é o sentido, isto é, constitui a expressão do ideal a transmitir: é a alma do Jogo. É a adesão íntima dos participantes no Jogo a este e ao seu sentido: é a alma do jogador.
O Imaginário, no qual ocupam papel de destaque os Símbolos, é, não apenas o contexto da Mística proposta, mas o próprio texto: não é apenas o contexto. Não constitui apenas uma ilustração, um ambiente ou uma decoração extrínseca da proposta de sentido; É o próprio texto: é pelo Imaginário que se explicita, em pleno Jogo, o sentido intrínseco, o ideal que o próprio Jogo quer desenvolver. O Imaginário – e, nele, prevalecem os Símbolos – é a própria proposta de sentido, a redefinir-se permanentemente na sua formulação, de modo a manter sempre a capacidade de ir ao encontro da situação e das expectativas dos jovens, cumprindo o “aforisma sagrado” de Baden-Powell: “Ask the boy!”.
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Muito bom !!
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